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Tributação de Dividendos: As Distorções na Alocação de Recursos e na Gestão Corporativa

Neste Perspectiva Tributária avançaremos para o que nos parece ser o quinto elemento negativo de relevância na reinstituição da tributação de dividendos, já que esta, ao menos da forma proposta, desencadeia uma série de distorções profundas nas decisões empresariais, alterando radicalmente a lógica de alocação de capital e a dinâmica gerencial das companhias. Longe de ser um ajuste neutro, o imposto sobre dividendos influencia negativamente a eficiência econômica, potencializando práticas motivadas pela busca de economia fiscal em detrimento do desenvolvimento produtivo e da transparência do ambiente de negócios.

Reter Lucros Além do Ideal: O Novo Normal?

Um dos impactos mais visíveis da tributação de dividendos é o incentivo à retenção excessiva de lucros. Na tentativa de adiar ou mitigar a incidência do imposto, empresas passam a manter valores expressivos em caixa ou reinvestir em projetos menos atrativos apenas para evitar a distribuição tributada. Esse comportamento, ao contrário da lógica econômica saudável — em que o capital deveria fluir para os investimentos mais produtivos ou ser redistribuído aos acionistas para ser realocado livremente no mercado —, perpetua a má alocação de recursos e pode comprometer a rentabilidade de longo prazo.

Endividamento Artificial e Manipulação da Estrutura de Capital

Outro efeito colateral frequente é a busca por endividamento artificial. Com a tributação tornando o capital próprio mais oneroso que o capital de terceiros, a tendência é que as empresas privilegiem a captação de dívidas, já que os juros pagos podem ser deduzidos do imposto de renda, reduzindo a base tributável. Embora o uso de alavancagem financeira faça parte da estratégia corporativa, sua utilização excessiva — motivada exclusivamente pela lógica fiscal — aumenta o risco financeiro e pode fragilizar a saúde econômica da companhia, sobretudo em cenários de alta volatilidade de juros e de mercado.

Recompra de Ações como Ferramenta Fiscal

A recompra de ações, por sua vez, passa a ser vista frequentemente como alternativa à distribuição tradicional de dividendos. Em determinados regimes fiscais, a tributação sobre ganho de capital (gerada quando o acionista vende ações após valorização causada por recompra) pode ser inferior ou mais flexível, tornando-se um mecanismo mais eficiente, do ponto de vista tributário, para retorno de capital aos acionistas. Entretanto, quando essa estratégia é guiada primordialmente por razões fiscais — e não como decisão legítima de alocação de capital visando maximização do valor da empresa — pode distorcer o valor percebido das ações e a própria governança corporativa.

Consequências Sistêmicas: Inovação, Eficiência e Transparência em Risco

O efeito dominó dessas estratégias tributárias não atinge apenas a esfera interna das empresas, mas reflete em todo o ambiente econômico. O capital passa a ser direcionado por vetores fiscais e não econômicos, sufocando a inovação, a eficiência operacional e a competitividade do mercado brasileiro frente a jurisdições mais racionais do ponto de vista tributário. Além disso, a estruturação de operações complexas para fins de planejamento tributário pode prejudicar a transparência das demonstrações financeiras, dificultando a análise do real desempenho da empresa por investidores, reguladores e mercados.

Insegurança Jurídica e Ônus Operacional

A complexidade adicional imposta pela nova sistemática eleva custos operacionais, obriga adaptações em sistemas e equipes e acirra o risco de interpretações divergentes entre empresas e Receita Federal, especialmente em grupos com estruturas societárias sofisticadas ou operações internacionais. Esse ambiente de instabilidade e incerteza compromete o planejamento estratégico e eleva o risco de litígios tributários, desviando energia e recursos da atividade fim da empresa para a gestão de contingências fiscais.

Reflexão

No ambiente brasileiro, a introdução de tributação sobre dividendos — sem contrapartida de redução significativa das alíquotas corporativas — tende a acentuar estas distorções: reduz o incentivo ao investimento produtivo, direciona energia dos gestores para estratégias fiscais e não à eficiência operacional, e compromete o ambiente de negócios em termos de inovação, geração de empregos e produtividade de longo prazo.

Diante desse cenário, resta o questionamento: até que ponto o fisco deve interferir nas decisões de gestão do lucro empresarial? E como equilibrar a necessidade de arrecadação com a preservação da eficiência, da transparência e do dinamismo do ambiente corporativo brasileiro?

A partir dos próximos artigos tentaremos sugerir de maneira afirmativa e pró-ativa opções ao modelo proposto a fim de evoluirmos no debate.