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Tributação de dividendos ao redor do mundo

Avançando em nossa análise no Perspectiva Tributária de hoje, pretendemos demonstrar que a elevação da tributação sobre dividendos no Brasil não é um fenômeno isolado, mas faz parte de uma discussão global sobre justiça fiscal, crescimento econômico e captação de investimentos. É essencial entender os reflexos econômicos concretos dessa política, sobretudo em países com baixo índice de poupança interna e grande dependência de financiamento privado para sustentar expansão industrial, inovação e geração de empregos.

 

Aspecto Econômico do Impacto: Menos Reinvestimento, Menos Crescimento

Quando empresas precisam destinar uma fração maior de seus lucros distribuídos ao pagamento de tributos sobre dividendos, observam-se efeitos negativos em cadeia para o ambiente econômico:

  • Redução do capital reinvestido: Ao tributar dividendos, há menor incentivo para que lucros sejam reinjetados nas operações produtivas da própria empresa, pois parte relevante desse resultado é apropriada pelo Fisco, prejudicando o ciclo virtuoso de reinvestimento que alimenta inovação, modernização tecnológica e ampliação da capacidade produtiva.
  • Menor expansão e inovação: Setores intensivos em capital – como infraestrutura, tecnologia e indústria – dependem de reinvestimentos recorrentes para ampliar mercado, lançar produtos e adotar novas tecnologias. A redução desses aportes tende a retardar projetos estratégicos e limitar o crescimento sustentado, o que, naturalmente, deixa nossos produtos menos atraentes ao mercado interno e externo.
  • Geração de empregos impactada: Sem capital para expansão, as empresas criam menos vagas, investem menos em treinamento e na retenção de mão de obra qualificada, o que enfraquece o ecossistema de inovação e limita o avanço da produtividade nacional.

 

Dados e Estudos Recentes

Um estudo do Ipea[1] detalhou os possíveis efeitos da reintrodução da tributação de dividendos no Brasil: com simulações de alíquotas fixas de 15% e progressivas até 27,5%, os impactos distributivos são discretos em termos de redução da desigualdade (queda no índice de Gini* de até 1,5%), mas o aumento da arrecadação pode superar R$ 100 bilhões/ano. No entanto, tal incremento fiscal ocorre ao custo de desestimular o reinvestimento e limitar a expansão empresarial – fatores críticos em economias emergentes com baixa poupança interna.

 


 

*Índice de Gini:

O Coeficiente de Gini, também conhecido como Índice de Gini ou Razão de Gini, é uma medida estatística amplamente utilizada para quantificar o grau de desigualdade na distribuição de renda ou riqueza em uma determinada população. Foi desenvolvido pelo estatístico italiano Corrado Gini em 1912.

O que ele mede e como funciona:

O Coeficiente de Gini mede a concentração de renda ou riqueza, apontando a diferença entre os rendimentos dos mais pobres e dos mais ricos em um grupo. Ele reflete a desigualdade socioeconômica de um território.

  • Valores: O coeficiente de Gini varia de 0 a 1 (ou de 0% a 100%).
    • 0 (ou 0%): Representa a igualdade perfeita, onde todos na população têm exatamente a mesma renda ou riqueza.
    • 1 (ou 100%): Indica a desigualdade máxima (perfeita), onde toda a renda ou riqueza está concentrada em uma única pessoa, e o restante da população não possui nada.
  • Interpretação:
    • Quanto mais próximo de 0, menor é essa desigualdade, indicando uma distribuição de renda mais equitativa.
    • Quanto mais próximo de 1 (ou 100%), maior é a desigualdade na distribuição de renda.

Como é calculado (Curva de Lorenz): O cálculo do Coeficiente de Gini é feito com base na Curva de Lorenz. Esta curva é um gráfico que representa a distribuição acumulada da renda em relação à população acumulada.

  • No gráfico da Curva de Lorenz, o eixo horizontal (abscissas) representa a porcentagem acumulada da população (ordenada da mais pobre para a mais rica), e o eixo vertical (ordenadas) representa a porcentagem acumulada da renda.
  • A linha diagonal de 45 graus no gráfico representa a igualdade perfeita de renda. A Curva de Lorenz, por sua vez, mostra a distribuição real da renda.
  • O Coeficiente de Gini é a razão entre a área entre a linha de igualdade perfeita e a Curva de Lorenz, dividida pela área total abaixo da linha de igualdade perfeita.

Matematicamente, é expresso como: G=A+BA​, onde:

  • A é a área entre a linha de igualdade perfeita e a Curva de Lorenz.
  • B é a área abaixo da Curva de Lorenz.

Importância: O coeficiente de Gini é uma ferramenta crucial para economistas e formuladores de políticas públicas, pois permite:

  • Avaliar a desigualdade econômica: Identificar o nível de concentração de renda em uma sociedade.
  • Comparar diferentes regiões ou países: Facilitar a análise comparativa da desigualdade de renda entre diferentes áreas geográficas.
  • Monitorar mudanças ao longo do tempo: Observar tendências e avaliar a eficácia de políticas destinadas a reduzir a desigualdade.

Limitações: Apesar de ser uma medida amplamente utilizada, o coeficiente de Gini possui algumas limitações importantes:

  • Sensibilidade à distribuição de renda: O coeficiente pode não capturar adequadamente mudanças na distribuição de renda em diferentes segmentos da população. Duas sociedades com o mesmo coeficiente de Gini podem ter distribuições de renda muito diferentes.
  • Desconsidera fatores não monetários: Não leva em conta aspectos como acesso a serviços públicos (saúde, educação), que também influenciam o bem-estar econômico e a qualidade de vida.
  • Não indica a causa da desigualdade: O coeficiente fornece uma medida da desigualdade, mas não identifica os fatores subjacentes que a causam.
  • Variações na medição: Geralmente mede a desigualdade por domicílios, o que pode não levar em conta o número de pessoas em cada um ou a composição familiar, que impactam a renda per capita.

Portanto, é sempre recomendável utilizar o coeficiente de Gini em conjunto com outros indicadores socioeconômicos para obter uma compreensão mais abrangente da desigualdade em uma sociedade.


 

Conclusão

A elevação da tributação dos dividendos limita, em escala concreta e comparada, os recursos disponíveis para reinvestimento privado. Esta restrição desencadeia um efeito cascata: menor expansão, menos inovação e geração de empregos, além de distanciar o país dos padrões internacionais de crescimento sustentado. No caso brasileiro, com histórico de ajustes tributários oscilantes e tradicional dependência de reinvestimento empresarial, o risco de estagnação econômica e perda de competitividade global é real e progressivo.

 

[1] https://repositorio.ipea.gov.br/server/api/core/bitstreams/53284f3e-f7d7-4320-a167-114ebb6eb110/content